A compreensão detalhada da consciência não pode nos tornar mais céticos ao descobrirmos, por exemplo, que há, no cérebro, uma região responsável pelo amor ou outra pela fé?Mesmo que venhamos a compreender a mente com mais profundidade, será muito difícil desvendar mistérios como a origem do universo ou o que faz com que nos apaixonemos por outra pessoa. É possível que nunca cheguemos a desvendar essas questões talvez nosso cérebro não tenha capacidade para compreender certos enigmas...Como a crença em Deus...Exatamente. Acho improvável que a neurociência consiga, um dia, apresentar razões para que as pessoas tenham ou deixem de ter fé numa inteligência superior. Elas podem até deixar de acreditar em milagres. Mas a ciência não tem como concluir que o Criador existe ou deixa de existir. A fé e a origem do universo não são problemas científicos passageiros. Mesmo assim, o conhecimento da mente pode mudar a forma como nos relacionamos com a vida. As pessoas tendem a aceitar a morte em função da complexidade do universo. Acho que deveria ser o contrário: constatando como a vida é frágil, podemos dar mais importância a ela e trabalhar para que seja a melhor possível enquanto dure.A cada ano surgem um novo antidepressivo e drogas que provocam emoções artificiais. Você acredita que, no futuro, teremos uma droga que possa acabar com as emoções ruins?Acho que sim. É uma questão importante, que precisaremos discutir cada vez mais. Imagine uma superpopulação tomando Prozac diariamente. Esse grupo de pessoas alteraria um sistema natural e poderia causar diversos problemas é claro que alguns problemas seriam resolvidos, mas as conseqüências da proliferação dessa medicação poderiam levar à ruína de uma sociedade. Tem que haver mais investigação sobre como essas drogas serão usadas. É claro que as pessoas deprimidas devem ser tratadas, mas pode ser um erro tomar o medicamento apenas para inibir a timidez e impulsionar a vida social. A ciência precisa trazer mais informações para que esses temas não sejam discutidos pela simples opinião ou intuição de algumas pessoas. Chegaremos, um dia, a manipular tão bem as áreas do cérebro que poderemos reproduzir com uma pílula a sensação de voar ou de passear numa montanha russa?É bem provável que isso seja possível. E, sem dúvida, para a sociedade esse será um assunto tão polêmico quanto o da clonagem genética. Vamos ter que decidir o que deve e não deve ser permitido exatamente como na regulamentação da indústria do cinema e da televisão. Há um ponto em que tanto a criação artística quanto a científica precisam ser filtradas pela sociedade. Mas não podemos deixar que um burocrata decida isso. Quanto mais informações forem divulgadas no futuro, inclusive por meio desta revista, mais condições a sociedade terá para tomar suas decisões.Que outro tipo de realidade virtual poderá ser criada, no futuro, manipulando o cérebro?Prefiro não especular, tudo ainda não passa de teoria.O estudo da consciência humana é um campo da ciência à espera de um novo Newton?O problema da consciência é um tema complexo, que tem sido mal abordado. É evidente que é necessário avançar muito mais. Acho que meu livro O Mistério da Consciência traz alguns avanços importantes sobre o assunto, mas não devemos ter a ingenuidade de acreditar que tudo está resolvido.
Há imensos problemas à espera de mais investigação e trabalho. Nos próximos dez ou 20 anos, talvez seja possível resolver boa parte deles.Como escrever sobre assuntos tão complexos para o público leigo?Os temas sobre os quais escrevo são importantes demais para ficarem restritos aos cientistas. Escrever sobre o pâncreas ou o fígado pode ser atraente apenas para os médicos, mas o público tem interesse quando falamos da mente, do pensamento, da emoção e do sentimento. É fantástico o retorno que tenho recebido dos leitores dos meus livros em todo o mundo. Interessados em arte, literatura e cinema dizem que essa pesquisa os ajuda a compreender melhor o que fazem nas suas próprias áreas.
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